Cenário econômico da Tríplice Fronteira é debatido em Foz do Iguaçu
Por Juliana Dotto
Cerca de 80 pessoas, representantes de conselhos de desenvolvimento econômico e social das cidades de Foz do Iguaçu, Ciudad del Este e Puerto Iguazú (Codefoz, Codeleste e Codespi, respectivamente), participaram do 1.º Seminário Econômico de Fronteira. A ação, integrante do Projeto Fronteiras Cooperativas, foi realizada em Foz do Iguaçu no dia 21 de junho e contou ainda com a presença de especialistas, empresários e membros dos três conselhos.
Conforme explica o consultor do Sebrae/PR Augusto César Stein, o encontro teve por objetivo provocar a discussão sobre a economia de forma integrada entre os países. “Agora, que já contamos com os conselhos formados nas três cidades de fronteira, precisamos falar sobre temas pontuais e estratégicos. A realidade e o momento econômico de um país afetam os demais, positiva ou negativamente. Desta forma, nosso intuito é abrir um debate sobre a questão, fazendo com que um conheça melhor o outro e possam encontrar soluções conjuntas”, frisou Stein.
No centro dos debates, cada conselho indicou um especialista para abordar o panorama da economia em seu país e, após, interagir entre si e o público presente. Doutora em economia, a brasileira Mirian Beatriz Schneider abriu as explanações sobre a situação econômica no Brasil. “Somos um país integrado ao mundo, e o que acontece aqui é um processo de crise internacional. Retraímos as demandas, e isso afetou o preço das commodities, que, em consequência, afetou o valor exportado, atingindo a arrecadação nos estados”, observou.
De acordo com a economista, paralelamente à crise econômica, o Brasil vive a instabilidade política. “Esse não é um cenário simples, mas é resultante de um processo, e o erro foi, ao longo de 2013/2014, não dimensionar o quão grande era esse processo. O ano passado foi um período de paralisação completa, e eu acho que não é um cenário só brasileiro, mas a América Latina inteira entrou em uma espécie de letargia. Assim, considero que essa discussão não pode ficar restrita ao cenário interno”, provocou Mirian.
Mestre em economia e atual vice-ministro no Ministério da Indústria e Comércio do Paraguai, Óscar Stark concordou com os impactos diretos que os três países têm em relação às macroeconomias nacionais, principalmente nas cidades que ligam a fronteira. “Nossa projeção de crescimento neste ano é de 3%, uma taxa menor do que vínhamos crescendo. Isso tem relação com a economia do Brasil principalmente e também da Argentina. Um impacto muito forte em um país que tem grande parte da população concentrada na fronteira”, alertou Stark.
Ciudad del Este, na avaliação do especialista paraguaio, é a primeira a sentir os impactos econômicos dos países vizinhos. “O consumo brasileiro tem um impacto muito grande no comércio de Ciudad del Este. A fronteira tem essa ligação muito forte, por isso é muito importante que tenhamos essa abertura para o diálogo. Precisamos nos conhecer cada vez mais e buscar complementação entre nossas economias, sobretudo na fronteira onde se encontram nossos países unidos por três cidades. Há, sim, muitas possibilidades de crescimento e desenvolvimento conjunto”, assinalou.
Além de contextualizar um pouco do cenário na Argentina, o economista e especialista em Mercosul (Mercado Comum do Sul) Gustavo Segré abordou sobre a responsabilidade da Tríplice Fronteira. “Se você analisar, a região que concentra o Mercosul é aqui, não tem outro lugar onde se tem três cidades, três estados e três países. Em função disso, é muito importante que um projeto de incorporação unificada, por exemplo de produção, aconteça aqui, para mostrar que o Mercosul, de fato, tem futuro”, explanou.
Em sua avaliação, a proposta de união produtiva de bens em um produto “made in Mercosul” até agora não aconteceu. “Ou o Mercosul retrocede a zona de livre comércio, em que cada um faz o que acha melhor, ou o Mercosul mantém a união aduaneira que temos hoje, mas reforçando o critério do objetivo conjunto (vamos fazer um produto juntos?). Se conseguirmos fazer alguma coisa neste sentido aqui, mostraremos aos pessimistas que é possível. Então a responsabilidade desta região, em particular, é decisiva”, enfatizou Segré.
“Se a gente reunisse a América Latina, seríamos uma força geopolítica com uma estratégia absolutamente diferente de inserção internacional.”
Mirian Beatriz Schneider, economista
União
Segundo Augusto Stein, do Sebrae/PR, foi com o objetivo de unir atores atuantes nas três cidades de fronteira que o Projeto Fronteiras Cooperativas começou em 2014. “Quando começamos o projeto, o Codefoz já estava consolidado, desde 2012. Em seguida, as instituições do Paraguai e Argentina, com o apoio do Fronteiras Cooperativas e tendo como base o modelo de Foz do Iguaçu, também instituíram seus conselhos: o Codespi (Puerto Iguazú) e Codeleste (Ciudad del Este), criados no final de 2015. Essas governanças concretizam o desafio de desenvolvimento da fronteira como um todo”, apontou.
“Trabalho muitos anos com comércio internacional, e minha posição é de que nós não conhecemos, não comerciamos e não fazemos planos juntos, por isso somos tão frágeis”, complementou Mirian Beatriz Schneider. Para ela, o mercado comum aumentaria a competitividade internacional. “Se a gente reunisse a América Latina, seríamos uma força geopolítica com uma estratégia absolutamente diferente de inserção internacional. O quadro de fronteira, especificamente, não deveria ser discutido separado, e existe um cenário de retomada da expectativa positiva”, assegurou a economista brasileira.
O argentino Segré alertou ainda para o momento crucial que pode fazer com que a engrenagem do mercado integrado comece a funcionar. “Este é o momento decisivo, porque você tem um governo novo na Argentina, um governo interino no Brasil que já está fazendo mudanças e que, mesmo em qualquer uma das opções, seja que o interino continue, seja que retorne o presidente afastado, nada será igual como era. Então, essa realidade pode trazer a incorporação do Paraguai dizendo que ambos estão sob novas perspectivas e que é preciso seguir junto, sair da zona de conforto”, salientou.
Voz no Mercosul
Outra conquista esperada pelos conselhos da Tríplice Fronteira é a possibilidade de ingresso no SGT 18, um subgrupo de trabalho do Mercosul que foi recém-criado para tratar somente de assuntos relativos às fronteiras entre os países integrantes. A “cadeira” é pleiteada para a governança trinacional desde maio deste ano, em reunião para formatação do SGT 18 em Montevidéu, no Uruguai.
O presidente do Codefoz, Roni Temp, acredita que as chances de sucesso do pedido de integração ao subgrupo do Mercosul são muito positivas. “Somos a maior fronteira do Brasil em população e importância. Queremos um representante para poder levar os anseios da região do Iguaçu para esse grupo. Reforçando, inclusive, que a nossa representatividade vai ser alternada, formada ora pelos conselhos no Brasil, Paraguai e Argentina”, garantiu.